quarta-feira, 27 de janeiro de 2016

História Concisa de Portugal

"Um diplomata português desta época, José da Cunha Brochado, relata nestes termos o conceito em que as élites portuguesas eram tidas em França:
«Em Portugal não há ciência, nem há política, nem há economia, nem há educação, nem há nobreza e não há corte. As letras estavam desterradas; nos conventos apenas se sabia rezar o ofício divino; ninguém sabia, nem era versado em história da Bíblia e livros sagrados. Os padres [grandes filósofos da igreja] e os concílios eram incógnitos. Das histórias humanas, nem a sua sabiam, e ignoravam totalmente a sua mesma origem, as suas conquistas, os seus interesses e as suas máximas. Tudo para eles [para os Portugueses] era indiferente: a paz ou a guerra ou a neutralidade, a Casa da Áustria ou a da França. Os meios para estabelecerem um bom comércio, não os estudavam; nem entendiam que este era o caminho de se ganharem ou se perderem. Estudava-se um pouco de teologia escolástica, cansando-se muito em argumentos sofísticos e delgadezas inúteis e impertinentes. A ciência que mais aprendiam era o direito civil, porque era a menos necessária e a mais nociva; e daqui nascia que se cansavam os juízes e os letrados com estudo escusado e com alegações e discursos cansados, em dano das partes. A nobreza era altiva sem medida e tratavam-se como deuses, falando pouco e recatando-se sempre do comércio, na consideração e temor de caírem nalgum acto de confiança [ = familiaridade] em que fiquem menos divinos. Eram sumamente pobres e não tinham frequência na corte, nem trato em que aprendessem as artes de um cavalheiro, as quais para eles eram totalmente desconhecidas, como se foram criados em um monte ou aldeia. Não lhes ensinavam as artes liberais, nem havia quem soubesse falar a sua mesma língua por não haver mestres nem governadores dos filhos. Se entre eles há algum que quer falar em matérias de ciência ou políticas, fazem zombaria dele e o tratam como homem estudante, que é o mesmo que um louco insensato. Em suas casas não há aquela magnificência de criados que costuma haver nas casas dos grandes senhores; os criados não têm ocupação certa, nem servem com formalidade ou com grandeza alguma. Sobre a economia da cidade [economia pública] não há nenhuma atenção; vivem com aquilo que casualmente têm, sem saberem se podem ter mais, ou viver melhor.»"

José Hermano Saraiva

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